Tudo normal não fosse o facto da livraria ser um
estabelecimento de venda ao balcão sem nenhuma estrutura que facilite as
transacções através da Internet.
AMADORA
Não sei como, no entanto, há um cliente da Amadora que,
regularmente, faz encomendas por e-mail. Não sei como tomou conhecimento da
livraria mas, certamente, através do blogue (http://adasartes.blogspot.com).
Porque engraçou com esta e não com outra é um mistério que, um dia, talvez
venha a desvendar. Até porque o cliente, por vezes, telefona quando a encomenda
demora mais um pouco e até já conversamos um bocadinho Pode ser que, numa
dessas ocasiões, e já com mais à vontade, tenha coragem de o sondar sobre o
assunto. Nunca vi esta pessoa que, segundo as estatísticas do programa de
facturação, está entre os vinte melhores clientes individuais.
LISBOA
Outro cliente, este já há muito passado para o rol dos
amigos, vive em Lisboa. Trabalha numa empresa que lhe dá fácil acessibilidade a
toda a cidade mas o seu local de trabalho é junto ao Parque Eduardo VII onde,
como se sabe, se realiza todos os anos a Feira do Livro que, por acaso, está
agora a decorrer. Chamemos-lhe JP.
O JP vem regularmente a Sines passar fins-de-semana, muitas
vezes prolongados. Conhecemo-nos no dia em que a livraria abriu. E a coisa não
correu muito bem de início graças a um mal-entendido.
Estávamos, então, a acabar de arrumar o espaço mas já com a
porta aberta. O JP assoma-se à entrada, espreita e pergunta:
- Pode-se entrar?
Atarefado, distraído e descuidado, respondo:
- A porta está aberta!...
A intenção não foi má… JP não desarma e, com a sua
frontalidade e meio indignado, responde:
- Que está aberta, eu sei! Educadamente perguntei se podia
entrar?!
Claro que me desfiz em desculpas e o JP compreendeu. Até
hoje! Ficámos amigos.
Agora, quando nos visita, invariavelmente traz alguma coisa
que faz sempre falta num estabelecimento: Papel A4, clipes, agrafos, elásticos,
post-it… Antes de cá vir telefona a perguntar das necessidades deste tipo de
produtos. Nunca quis receber dinheiro. A esposa faz um bolo para nos oferecer.
Mas, mesmo que não venha a Sines, JP está sempre presente e
atento. Mal topa com uma promoção rentável numa grande superfície, telefona-me
indignado:
- Oh senhor Joaquim, como é que vocês hão-de sobreviver?
Veja lá que estou no (nome da superfície comercial) e estão a dar 50% (ou 40%
ou o raio que os parta) em livros… Nas novidades! O JP, fruto de muitas horas
de conversa na livraria, apercebe-se de muitas das nossas desesperanças e
preocupações:
- Eu vou dizer-lhe os títulos. Quer que eu lhe compre algum?
É que, assim, ainda compra mais barato do que se for à Editora! Quando for a
Sines eu levo-lhos ou, se quiser, mando já pelo Correio.
Agradeço com amabilidade mas, sistematicamente, recuso a
oferta.
Pensam que o JP aproveita a oportunidade para comprar algum
daqueles livros para ele? Não. O JP encomenda-me os livros que quer, estejam
numa daquelas promoções (?) ou não e, quando vem a Sines, paga e leva para
casa. Para Lisboa. Ao preço de Editor menos o desconto possível que,
obviamente, me sinto na obrigação de lhe fazer.
SINES
Depois de vir do Correio abri a livraria. Vinte minutos
depois entra o primeiro cliente. É da terra, vejo-o de vez em quando e, por
vezes, entra na livraria. Desta vez:
- Tem livros sobre Angola?
- Sim senhor. Dos países africanos de língua portuguesa
estão nesta estante.
O cliente lá foi, demorou-se alguns minutos, escolheu e
colocou sobre o balcão cinco livros:
- Tem Multibanco?
- Com certeza.
Penso para mim: Bom, o dia não começa mal! Há dias inteiros
em que não totalizo tal montante!
Registo a venda, digo o valor enquanto coloco os livros num
saco. O cliente passa-me o cartão, faço a operação na máquina e, enquanto
aguarda o recibo, com ar simpático e como que a desculpar-se, vai dizendo:
- Este ano não vou à Feira do Livro… Estou a trabalhar,
tenho a mulher doente… Portanto, tenho que comprar aqui…
- Obrigado, volte sempre!
Joaquim Gonçalves
Sines, 7 de Maio de 2012
(imagem retirada do blogue o livreiro)